Quando eu descobri que me amava, me descobri amando as
pessoas em sua simplicidade. Eu estava curtindo as plantas daninhas que nasciam
na roseira. Eu achava bonito sair pra fazer a feira e trocar miúdes com a
mulher que me vendia abacaxi.
Nem sempre foi assim. Teve dias que eu rodava que nem barata
tonta, e amava mais aos outros que a mim.
Eu nunca me convidei pra uma cerveja. Nesse tempo eu
procurava poemas pra curar o amor por outras pessoas. Eu não conhecia Manoel de
Barros, e como consequência eu não conhecia meu quintal, e nem sabia que ele
também era o maior do mundo.
Quando eu descobri
que me amava, eu ganhei mais tempo pros amigos. Tem dias que passamos horas em
silêncio, fazendo comidinhas e usando o vazio dos pensamentos afortunados.
Nem sempre foi assim. Eu não sabia que era errado pensar
certo. Ninguém é tão certo e ninguém é tão errado. Eu achava que em alguma hora
da minha vida eu ia receber título Doutor Honoris das causas impossíveis. Aí eu
vi que a possibilidade é uma matemática de dois gumes. Eu tenho chances e a
vida acontece. Nem sempre ela é boa pra mim, mas eu preciso ser o melhor dela!
Aí teve um dia que eu me conheci me reconhecendo em outra
pessoa. E ela não me deu escolha: Ou eu amava a mim, ou ela não me amava. Aí eu
compartilhei com ela o respeito por pessoas que descascava abacaxi todos os
dias, compartilhei poemas, mas ela não entendia, e eu comecei a entender que os
poemas eram meus, não dela. Compartilhei as comidinhas silenciosas, e os pensamentos
vazios afortunados.
O amor me possibilita,
Amar, acontece.